Daqui (selo Pau Brasil), o mais recente CD do grupo
instrumental Pau Brasil, tem exatos 65 minutos e 13 segundos divididos em dez
faixas. Tocadas por Nelson
Ayres (piano), Rodolfo Stroeter (contrabaixos acústico e
elétrico), Paulo Bellinati (violões), Teco Cardoso (saxofones soprano, alto e
barítono e flautas) e Ricardo Mosca (bateria), seus arranjos e suas
virtuosidades atestam a excelente forma dos moços.
Hoje o som deles voltou a me balançar e a me alegrar. O
repertório do álbum atual traz as conhecidas Pai (Baden Powell e Paulo César
Pinheiro), Rancho Fundo (Ary Barroso e Lamartine Babo), Agora Eu Sei (Moacir
Santos), Saudades do Brasil (Tom Jobim) e Bachianas
Brasileiras nº 1 - Prelúdio (Modinha), de Heitor VillaLobos,
porém os outros temas são composições dos próprios músicos do Pau Brasil.
Trata-se de um repertório relevante, que traz a marca de um grupo que desde o
início dos anos 1980 instiga a brasilidade da música instrumental
contemporânea.
No arranjo de Paulo Bellinati para Pai, tambor e cincerro
puxam a introdução. O violão inocula sua pegada com o DNA de Baden. Tudo muito
forte, viril mesmo. A introdução prenuncia o que virá. Os saxes vêm aos poucos.
O som grave do sax barítono tem em si a potencialidade da harmonia. Juntos, os
saxes e a percussão seguem firmes. O baixo cria um desenho a partir da melodia;
o violão vem junto e sola. O suingue é desconcertante. A música se mostra bela.
Dois saxes trazem a melodia para si, o andamento muda, um rallentando os conduz
a uma atmosfera em que brilham, mais uma vez, o tambor e o cincerro. A eles
cabe um improviso, ao qual o baixo logo adere. Pausa de alguns compassos. Logo
após, o violão emerge com citações de Consolação (samba clássico de Baden e
Vinicius) — alusões que se repetirão ao longo do belo arranjo. Ad libitum, o
barítono chama uma nota bem grave, enquanto a bateria cinge os pratos e o baixo
acrescenta sua pisada à melodia. O violão atrai o ritmo. Com ele vem a
percussão. Aos poucos a suingueira volta a acender o ouvinte. Meu Deus! O
violão sola um brilhante improviso, e, após alguns compassos, volta a
reverenciar Consolação. Uma nova pausa. Novamente arritmo, o improviso cabe ao
sax. Piano e violão o fortalecem. A firmeza do tema dá lugar à leveza.
O sax requer para si o improviso. Aos poucos o ritmo retoma
o protagonismo no arranjo. Um novo corte e surge um outro desenho: o que já
pontificou na primeira parte da música. A beleza desvenda tudo. O barítono
sola. Dois saxes tocam junto. E como um sonho bom que se repete, a percussão
volta à levada com a qual brilhou na introdução... Deus do céu!
É também de
Bellinati o arranjo para o tema de Moacir Santos: o baixo toca a introdução. O
violão inicia a melodia. O sax vem junto. A marchinha segue em ritmo vivo. O
violão improvisa. A bateria rufa a caixa. O piano sola. Todos seguem criando e
fazendo o mundo girar mais lento, dando vida e cor à manhã paulistana.
(Aquiles Reis- músico e vocalista do MPB4)
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